The Secret of Us é uma comédia de recasamento sáfica tailandesa, e como toda comédia de recasamento, sua graça vem do processo de reconquista de Ling por Orm, não de seu amor, que nunca deixou de ter, mas do seu direito de recebê-lo, desfrutá-lo, e não retê-lo ou resisti-lo, como um propriedade que se quer controlar.

Desde A Megera Domada de Shakespeare até The Awful Truth de Leo MacCarey, o popular gênero começa pela separação do casal por falhas de caráter das próprias personagens, embora essa falhas sempre reproduzam as questões de ideologia e propriedade do seu meio, especialmente o machismo e a diferença de classes, fazendo do gênero muito rico na busca de alternativas concretas para esse embates, pessoal e coletivamente. The Secret of Us se encaixa na problemática familiar, já que a separação de ambas se deve a intervenção da mãe de Ling a mando de sua classe social e heteronormatividade da ideologia dominante que a serve, mas esta separação pouco ou nada tem a ver com falhas de caráter e incompatibilidades pessoais, sendo as duas representadas como vítimas de suas circunstâncias de classe e gênero.

Compreensivelmente, Dr. Fahlada (Ling) rejeita as investidas de Earn (Orm), pois após o término em que Orm declarou-se hétero, colocando para Ling uma preferência inalcançável, esta sentiu-se roubada de seu amor, não investimento, mas um roubo, do qual a ladra se quer desfrutou. É claro que o término delas se deve à intromissão da mãe de Ling, zelando pelo hospital e a respeitabilidade da família, propriedades nas quais inclui a própria filha, não querendo permitir-lhe escolher sua sexualidade ou a quem entregar seu amor.

Como em todas as comédias de recasamento, temos os concorrentes de uma pelo coração da outra e vice versa, no caso de The Secret of Us, o casamento que a heteronormatividade e capitalismo exigem na figura da matriarca, o pretendente das aparências e da propriedade para Ling, Doutor Nu, cuja existência foi peça fundamental nas mãos de sua mãe para levar Orm a terminar o relacionamento de ambas, e a concorrente cabível na sexualidade de Ling, de moral e meios questionáveis, mas bela, a atriz Rati. Pelo amor de Orm, atriz que não responde às mesmas pressões de prestígio e propriedade que a ex, Ling terá de competir com a bela e generosa atriz Ingfa, que diferentemente de Rati, consegue abrir mão do próprio desejo pela felicidade da mulher que ama, Earn.

Nos alegramos quando finalmente Ling e Orm redescobrem mais do que seu amor mútuo, que sempre tiveram, a possibilidade de manifestá-lo, primeiro uma para a outra, e posteriormente para a sociedade, inclusive coroando o processo com a tradicional cerimônia de casamento, com as bençãos da mãe desconvertida da ideologia dominante heteronormativa, classista e homofóbica.

08/09/2024
09/09/2024
Revisão: 09/09/2024